O risco iminente de colapso de uma das minas da Braskem no bairro Mutange, em Maceió, agravou o imbróglio que veio à tona em 2018 relacionado às quase cinco décadas de extração de sal-gema na capital alagoana. A mineradora diz já ter reservado R$ 14,4 bilhões para indenizações e reparações pelo afundamento de bairros na cidade, que obrigou a desocupação de 14 mil imóveis desde 2018. O governo estadual e o Ministério Público cobram, no entanto, um reconhecimento de novas áreas afetadas e de mais valores a serem pagos por parte da empresa, que acertou em julho uma reparação bilionária à prefeitura de Maceió.
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Cinco bairros da capital alagoana — Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e Farol — foram afetados por afundamento do solo identificado em 2018, de acordo com o mapa de realocação elaborado pela prefeitura de Maceió. Em fevereiro daquele ano, fortes chuvas deixaram danos estruturais em imóveis do bairro Pinheiro, cujos moradores relataram tremores de terra. O fenômeno levou o Ministério Público Federal (MPF) a instaurar inquérito para averiguar a relação entre esses impactos e a atividade da Braskem.
A extração de sal-gema ocorre desde a década de 1970 em Maceió, tocada à época pela Salgema Indústrias Químicas S.A, que foi incorporada à Braskem em 2002. Desde a década de 1980, pesquisadores vêm alertando para riscos de afundamento na região. Houve protestos de moradores à época por conta de uma expansão das atividades da Salgema, que desejava ampliar sua produção de itens como soda cáustica e cloro.
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Após condução de estudos, o Serviço Geológico do Brasil (CPRM), órgão que integra o governo federal, concluiu em maio de 2019 que a atividade da Braskem estava relacionada aos danos em imóveis nos bairros Pinheiro, Mutange e Bebedouro, cujos moradores também já relatavam tremores de terra. A empresa, então, foi acionada pelo MPF para encerrar suas atividades em Maceió e para atuar, junto à prefeitura, na realocação e indenização de famílias que moravam nas regiões afetadas. Segundo a Braskem, foram desembolsados R$ 3,85 bilhões no chamado Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação (PCF) até outubro deste ano. Além disso, a empresa fechou um acordo com a prefeitura de Maceió, em julho, e desembolsou R$ 1,7 bilhão como indenização ao município.
Ainda assim, problemas recentes aumentaram a pressão sobre a empresa por parte do poder público. A área da mina 18, no Mutange, foi uma das primeiras a ser totalmente desocupadas, em abril de 2020, por ser considerada a área de maior risco. Ela ficava localizada dentro do antigo Centro de Treinamento do CSA, clube de futebol tradicional em Alagoas, que teve de se mudar por conta da situação.
A preocupação das autoridades é que o iminente colapso da mina pode gerar uma cratera na região. Conforma nota da Defesa Civil, o monitoramento indicou “possibilidade de rompimento e surgimento de um sinkhole”, termo que designa uma depressão no solo. “Por precaução, a recomendação é clara: a população deve evitar transitar na área desocupada até uma nova atualização da Defesa Civil, enquanto medidas de controle e monitoramento são aplicadas para reduzir o perigo”, disse a nota.
Por conta do risco de uma cratera, moradores de regiões vizinhas ao bairro Mutange também entraram em alerta. Segundo o g1, o Hospital Sanatório, no bairro Pinheiro, embora não fique na área de desocupação obrigatória, decidiu remover seus pacientes para outras unidades.
Na quinta-feira, mesmo dia em que foi emitido o alerta sobre a mina na área do bairro Mutange, o juiz Angelo Cavalcanti Alves de Miranda Neto, da 3ª Vara Federal de Alagoas, acatou um pedido de liminar do MPF, do Ministério Público estadual (MP-AL) e da Defensoria Pública da União (DPU) para obrigar a Braskem a incluir novas regiões de Maceió no mapa de realocação.
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Os imóveis incluídos ficam no bairro Bom Parto, mais ao sul, e estavam listados anteriormente como “área de criticidade 01” — isto é, de monitoramento. Agora, eles passam à “área de criticidade 00”, com inclusão obrigatória no programa de indenizações e realocação.
O custo adicional à Braskem gerado por esta nova desocupação ainda será calculado, mas o MPF atribuiu à ação um valor de R$ 1 bilhão. Em outubro, a Braskem calculava que 99,3% dos imóveis identificados em áreas de risco já estavam desocupados.
O governo do estado de Alagoas chegou a obter judicialmente, em abril, um bloqueio similar nas contas da Braskem, de R$ 1 bilhão, em outra ação judicial, que corre na 16ª Vara Cível da Justiça estadual. Nesta ação, o governo exige que a empresa, além de indenizar a prefeitura, também faça restituições ao estado, ainda a serem calculadas.
Em setembro, a Justiça desbloqueou o valor, após a Braskem apresentar garantias de que estava apta a desembolsar R$ 1,1 bilhão com o caso. Na ocasião, a empresa afirmou ter provisionado R$ 7,2 bilhões com futuros gastos relacionados ao afundamento do solo em Maceió, “incluindo-se a compensação do Estado pelos equipamentos públicos” afetados.
Hoje, a Braskem tem como acionista majoritária a Novonor, ex-Odebrecht. A Petrobras, que tem 36,1% das ações, avalia adquirir o controle da Braskem — o que, na avaliação de lideranças políticas de Alagoas, tem atrapalhado a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado para investigar a extensão dos danos causados pela empresa, algo que poderia acarretar em um aumento de indenizações e multas.